Wednesday, April 11, 2018

A pedagogia dos caracóis

Este é o título de um livro de Rubem Alves, escritor que conheci durante a graduação, lendo sua obra "Filosofia da ciência". Conhecido como o maior pedagogo brasileiro, escreveu diversos livros dedicados ao tema. 

A pedagogia dos carecóis é um livro sobre pedagogia, que traz com exemplos maneiras de melhorarmos nossas vidas como pais, professores e na vida. 

Pedagogia parece algo distante das vidas de não professores, mas se fazer entendido e despertar interesse pelo que se fala/escreve é algo essencial para a construção de uma vida profissional e pessoal melhor.


Pode obter o livro aqui
Veja o exemplo do próprio Warren Buffett, um dos grandes investidores, li no livro "A Bola de neve", sua biografia escrita por Alice Schroeder, que ele considera a obra de Dale Carnegie "Como fazer amigos e influenciar pessoas" como uma das mais importantes que já leu. O livro de Carnegie acaba sendo um livro de pedagogia também, quem já leu vai saber disto, recomendo para quem ainda não leu.

Neste sentido, vou registrar aqui no blog o livro de Rubem Alves, que trata de temas que nos possibilitam pensar sobre a vida e crescer como pessoas. Se podemos nos aprofundar em vários temas, por que não fazê-lo? Quando pensamos em um tema como esse ele pode parecer útil somente para quem dá aula ou para quem lida de alguma maneira com educação. Na leitura do livro você acaba percebendo que não tem como separar a educação da vida. A educação faz parte da vida e gastamos muito do nosso precioso tempo nos "educando" ou "educando" nossos filhos/subordinados. 

Para quem tem interesse neste tema, segue um aperitivo à leitura:

Parte 1: PARA OS PAIS

A cebola – o psicanalista, professor, escritor e pedagogo faz uma analogia de um bom currículo escolar à uma cebola cortada, sendo o centro da cebola uma criança e os anéis uma escalada do conhecimento. Para obter o conhecimento do terceiro anel só passando pelo primeiro e pelo segundo. Sendo assim, o primeiro anel seria a casa da criança, um local cheio de matemática, física, biologia e outras ciências. E não seria no nosso mundo a nossa grande casa?

Livro que faz chorar – Rubem Alves escreve que um livro que faz chorar pode ser melhor do que um que faz rir, pois a tristeza é uma coisa boa, ela significa que o leitor que chorou sentiu compaixão e conhecimento com compaixão só traz coisas boas. Seria então interessante gastar menos tempo com gramática e análise sintática (interpretação), e mais com leitura, pois sem a interpretação o texto permanece vivo e comove todas as vezes que lemos.

Os livros e a infidelidade – de acordo com o pedagogo, os livros nos levam à um outro lugar, então, um marido ciumento olhando para uma esposa lendo acha que ela está ali, na sua frente, mas na verdade ela está em outro mundo, de repente ela começa a sorrir e ele percebe que ela está tendo prazer sem ele. Os livros seriam locais de infidelidade e subversão, os quais poderiamos visitar e depois retornar para o mundo real com uma visão diferente.

QI-WI – a inteligência não está em saber as respostas, para isto basta boa memória. A inteligência consiste em saber o que as coisas nos perguntam. Todos sabem que a terra gira, mas por que ela gira? O conhecimento inicia-se quando as coisas nos provocam a fazer perguntas. Para cultivar a inteligência, devemos focar no meio, na travessia e não na partida e no fim.

A pedagogia do furto – destaca o poder pedagógico da vontade de roubar. Se você compra um livro, começa a ler na frente do seu filho e dá sorrisos, ele logo pergunta o por que, você diz que é o livro e não conta para ele. Ele sentirá vontade de ler. Então, é melhor despertar o desejo de roubar o cohecimento. Quem aí já não leu vários livros e textos de pessoas que consideram sábias na tentativa de roubar conhecimento delas?


Parte 2: PARA OS EDUCADORES

A libélula e a tartaruga – essa é uma fábula escrita por Rubem Alves que pode retratar, nas entrelinhas, a leveza do ser (libébula) ou a maturidade (tartaruga). Ao contrário do que esperava, no caso da pedagogia a leveza é mais funcional. Para os educadores o excesso de burocracia, de posições hierárquicas e de cobranças institucionais retira a leveza que favorece o aprendizado. Um diretor que fica muito atrás de uma escrivaninha atende menos as demandas do que o que fica menos. Dar mais atenção ao que as pessoas tem a dizer e ouví-las com empatia é fundamental para um ambiente de aprendizagem melhor.

Quanto custa um diploma? – a grande demanda por cursos superiores no passado levou ao aumento de vagas em faculdades, na maioria privadas, isso ocorreu devido ao equílbrio capitalista/econômico de demanda/oferta. No presente existem muitos graduados e poucos empregos para eles. A propaganda que se faz em cima da educação levou muitas pessoas a procurarem aquilo que não queriam, um diploma. O diploma não deve ser o objetivo da educação.

Em busca da infância perdida – quando criança temos uma sabedoria que perdemos ao nos tornarmos adultos. A pedagogia do amor, saber olhar para e como uma criança é fundamental na efetivação e construção do conhecimento. Uma criança tem um olhar sem limites, sem restrições e assombrado. Nós adultos pensamos poder compreender tudo dentro de certos limites. Então, criamos regras e organizações que nos cegam, como a compartimentalização do conhecimento.

A sala da diretora – nossa casa ou nosso escritório devem ter a nossa cara, não devemos colocar em um local algo que não nos represente somente por que simboliza autoridade ou poder. Ao optar por um ambiente mais amoroso e receptivo, os funcionários, colegas e até mesmo nós, nos sentiremos acolhidos. E ao se sentir acolhidos nos libertamos e aprendemos/evoluímos.

Os vestibulinhos – com o exemplo dos testes realizados pelas escolas para acesso à cursos, o pedagogo escreve que quem está concentrado em não ser reprovado não pode estar focado em aprender. Ao realizar esses testes nós acabamos por separar as pessoas em dois grupos, aprovados e reprovados, e todo o mérito para o primeiro. Isso cria um estigma para os reprovados que sempre se acharão inferiores por não ter aquele perfil. Este ambiente não favorece o prazer em aprender e algumas pessoas ficam até desestimuladas por isso.

O ninho do guaxo – o guaxo é uma pássaro que faz um ninho escultural. Traçando um paralelo entre esse pássaro e as pessoas, o autor coloca que, para que as coisas se realizem é preciso sonhar e o sonho nos leva a pensar e realizar. Se você quer fazer uma viagem, isso é um sonho, para concretizá-lo você deve pensar. Existem os sonhos individuais e os coletivos, um sonho coletivo pode ajudar a construir uma nação. Mas os sonhos são pouco relevantes na educação de hoje, deveriam.

A gripe literária – o prazer de aprender e o prazer de ler é algo essencial, sem ele não há como estimular ninguém. O estímulo vem do prazer, se você não tem prazer em fazer algo por que o faria? O autor coloca por exemplo uma poesia sendo apresentada para alunos em uma aula de português, não é prazerosa, pois é obrigatória. Na disciplina de português somos obrigados a fazer ficharios e coisas do tipo. Mas e se um professor de física começasse suas aulas com uma poesia? Seria poesia por poesia, poesia por prazer, poesia que embeleza e que atrai.

Defendendo-se dos adultos – a democratização dos espaços, inclusive escolares, leva à um ambiente mais manso o que favorece o aprendizado. Numa escola comandada por adultos, onde as disciplinas estão numa grade e onde o relógio é o senhor supremo, a indiciplina dos alunos é a revolta dos subordinados. Não há espaço para aprendizagem em um ambiente que apresenta-se na forma de gaiola, seja a escola, o escritório ou a sua casa. A aprendizagem é democrática.

Aprendendo com as caravelas – uma escola em portugal, Escola de Ponte, usa essa forma mais democrática de ensino. Os alunos ficam todos na mesma sala, pequenos e grandes. Aprendem a ler assim como aprendemos a falar, começando pelas palavras. A importância desse exemplo está no ponto de partida do nosso conhecimento, sempre devemos começar do todo e daí em diante destrinchar para a parte. As caravelas são o exemplo utilizado, com as quais podemos estudar física, astronomia entre outras disciplinas, que ao menos seriam percebidas como disciplinas, já que as coisas não se compartimentabilizam.

Professores de que não me esqueço – conta o pedagogo que tinha um professor de história que ensinava uma história ao avesso, ensinava que a história não acontece conforme pintam os pintores ou escrevem os escritores por encomenda. É importante reconhecer então que, o que existem são interpretações do que realmente aconteceu, segundo alguma pessoa. Outro professor, de química, passou cola para um aluno não reprovar em sua disciplina, reconhecendo que ele gostava era de literatura e hoje esse aluno é um escritor famoso. Dois exemplos de professores que entenderam que as disciplinas são pouco importantes como obrigatórias ou como compartimentos e que o importante é expandir a visão e despertar amor, prazer.

Avaliação: a máquina de fazer salsichas – enfatizando que o conhecimento deve sempre ser no sentido do que vai valer para a sua vida, o autor propõe que se fossemos avaliar hoje, o que aprendemos nas ecolas, provavelmente teríamos um indice muito baixo. isto se deve provavelmente à como vivemos esses anos escolares, quais eram os verdadeiros interesses e os verdadeiros prazeres que tinhamos, nós, os professores e todos os envolvidos no processo.

Primeiro amar, depois conhecer – o amor precede o conhecimento. Para ter interesse em estudar algo, antes devemos amá-lo. Se você ama o céu vai ser fascinante o estudo das estrelas. Então, se queremos que alguém tenha prazer em buscar conhecimento em alguma área, devemos incitar o amor à essa área. Professores devem ser provocadores de amor, antes de ensinadores de saber.

A pedagogia dos caracóis – o caracol é um ser lento e, lento, deve ser a dinâmica que propõe o aprendizado. A lerdeza não é algo ruim, pois é no caminho que se constrói e não na chegada. Ao correr o meio fica desvalorizado. Para que subir uma montanha muito rápido sem observar que no meio tem vistas fantásticas?


Parte 3: PARA A VIDA

Meditações sobre a felicidade – usando o exemplo de Zarathustra, o sábio, o autor mostra que ao compartilhar seu conhecimento Zarathustra se alegra e transborda de felicidade e com isso se transforma em mestre. Então, o aprendizado que vale a pena é o compartilhado, é o que traz a felicidade.

Inteligências e lâmpadas – assim como as lâmpadas a inteligência ilumina, diferentes capacidades de iluminação existem para as duas. Mas o valor delas está no que elas iluminam e não na sua capacidade. Uma lâmpada de capacidade maior pode iluminar um esgoto e uma de capacidade menor uma mãe acalentando seu filho. Assim funciona a inteligência e nós podemos usá-la para diversos fins, o nosso coração decide e o valor dela estará nessa finalidade.

Albert Schweitzer – um filósofo, músico, escritor e médico. Amava os seres viventes e por isso decidiu trocar a vida de reconhecimento no seu país natal (França) aos 30 anos, por uma vida que lhe fazia sentido no Gabão – África. A vida dele mostra que seu amor, seu interesse propiciou uma inteligência gigante, que foi aplicada de maneira espetacular e produziu uma vida iluminada. Pode ter sido taxado de louco por isso, por fazer o que os outros não fariam. Mas se precisamos ser loucos para sermos felizes, por que não?

Para quem quiser conhecer mais sobre a vida desse escritor/professor/filósofo/psicanalista brasileiro, recomendo o site do instituto Rubem Alves. Lá você encontra mais informações sobre sua obra e seu legado.

http://www.institutorubemalves.org.br/ 


Rubem Alves (1933-2014) - Orgulho para o Brasil
Espero que gostem de ler seu livro e estudar sua obra.

Abraço

2 comments:

  1. Muito bom Sequoia!

    Li o livro na minha segunda faculdade, de Educação Física, visando meu aprimoramento como voluntário na educação e achei muito bom!

    Estou revisando um artigo antigo para republicação e vou aproveitar esse seu resgate para citar um ponto desse livro! Obrigado pela lembrança!

    Abraço!

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    1. Andre, que bom que ajudou. O livro realmente e muito bom, obrigatorio. Vou ler outras obras dele e quem sabe faço um post sobre o que achei e uma sintese.

      Abraço

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